A pérola

Quando a viu na rodoviária, só tinha uma certeza: ela era linda e ele a amava. Os anos haviam passado e ela mudou muito. Cada dia mais linda. Os seus cabelos castanhos escuros, longos e ondulados, combinavam perfeitamente com seus olhos escuros e amendoados. Heitor recordava nostalgicamente dela. Lembrava que vê-la sorrir era um abrigo para ele, e ele se tornava um abrigo, uma fortaleza, quando ela chorava. Tomava-a em seus braços e jurava para si mesmo que jamais permitiria que ela se machucasse.

Mas ele se contradisse. Foi o primeiro a ir embora e deixá-la ao desalento. “Foi a força das circuntâncias…” – tentava se consolar e se redimir com seus próprios pensamentos. Ele era um homem bom, mas não era perfeito. Mas agora, que estava de volta, gostaria de fazer valer todo tempo que esteve longe. Ele se sentia como um grande colecionador que havia perdido sua pérola mais bonita.

Mas Alice era sim uma pérola. Perdida no país das maravilhas? Talvez. Ela também sentia muita falta de Heitor. Só ela sabia a falta que ele fazia. Ela lembrava dos cinemas em que ele a levava, das peças, dos algodões-doce, dos ursos-de-pelúcia… Foram dias difíceis sem ele. Não havia mais ninguém para empurrar o balanço. E ela, solitariamente, aprendeu a se balançar sozinha. Por um lado, viver sem ele, criou nela muita auto-suficiência. Aprendeu a fazer as coisas sozinhas. De contrapartida tinha a carência. Isso foi o que doeu mais.

Alice tinha em suas mãos uma fotografia com a foto dos dois. Ele estava lindo na foto. Foi numa daquelas máquinas de fotos instantâneas do shopping. Eles eram o par perfeito. Então, ela enviou para ele. Não disse mais nada. Apenas colocou as fotos dentro do envelope e colocou no correio. Uma imagem vale mais do que mil palavras, ela já sabia.

Quando ele viu o remetente, ficou ansioso e abriu a carta direitinho para não rasgar. Era o homem mais feliz do mundo. Ele quis voltar, mas ela não queria conversa. Se recusava a falar por telefone e ir encontrá-lo quando estava na cidade. Mas agora, depois de achar as fotos, ela mudou de idéia. E vendo aqueles retratos4x5, ele leu o que elas diziam.

Fez as malas, foi para rodoviária, pegou o ônibus e se sentou. Nervoso. Desceu e lá estava ela. Mais linda do que nunca. Como se tivesse encontrado finalmente a pérola perdida, ele não conseguia se conter de tanta felicidade. Ela sorriu, acenou. Deu-lhe um forte abraço. Ele, derretido, começou a chorar, enquanto implorava perdão. E ela, comovida, simplesmente olhou em seus olhos e disse:

– Eu já perdoei.

Foram para o café mais próximo, falaram sobre vestibular, trabalho, amor e família. Passearam em silêncio (não por falta de assunto, mas pelo prazer de ouvir o andar um do outro novamente). Encontraram uma daquelas maquininhas e entraram. Tiraram várias fotos. Mataram as saudades. Heitor pegou o ônibus de volta. Alice foi a pé para casa. No próximo feriado ela vai amar sair com o seu pai novamente.